In Memoriam

In Memoriam

2013
Duração: 30 minutos
Concepção/performer: Ludmilla Ramalho


Descrição
Uma mulher caminha pelos principais cruzamentos das avenidas de uma grande cidade, perfura o asfalto com um finco de ferro e rega as brechas com um líquido vermelho.


Sobre o trabalho
Ao abrir uma brecha no asfalto de uma grande cidade, a mulher de In memoriam retoma uma das passagens mais significativas da poesia brasileira do século XX: o poema "A flor e a náusea", que Carlos Drummond de Andrade publica em A rosa do povo (1945), no qual a flor rompe o asfalto e, com isto, o tédio, o nojo, e a vida sem surpresas e domesticada pelo capitalismo. No caso da performance, a brecha aberta nesta máquina do mundo matizada pelo asfalto que nos dá a ver a terra, escondida pela civilização, é regada com um líquido vermelho.

Não temos, assim, uma forma de vida vegetal, como em Drummond, mas pura abertura de uma perspectiva por um líquido que semeia, mas que também tinge de vermelho, a cor do sangue. Somos, então, remetidos ao sangue como marca do feminino, do útero, no qual reside a potência de uma vida vindoura: e o líquido, assim, parece prometer banhar o solo com o feminino. Esta racha no concreto hirto é como uma vagina, uma fissura na matéria que acolhe a semente e produz a vida, da mesma forma com que faz a terra ao ser semeada. Além disso, ao romper com o concreto, com a vida domesticada, previsível e entediante, o vermelho introduz afeto na dura e fria matéria, contaminando os fazeres repetitivos e automáticos da burocracia e do mercado por sensações, temperatura, cores, sons, imagens e, logo, memória (o que foi) e imaginação (o que pode ser).



Fotos: Guto Muniz
Texto: João Guilherme Dayrell


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