Eu me rendo

Eu me rendo

Performance
2015
Duração: 30 minutos


Descrição
Uma mulher, vestida de noiva e decidida a se render, avança sobre a tricheira de arame farpado que lhe arranca o vestido.


Sobre a obra
Entre diversos aspectos, pode-se dizer que esta performance matiza de forma complexa a liberdade feminina. Na maioria das sociedades patriarcais a mulher só pode sair do julgo familiar e ter vida sexual após o matrimônio. Não fortuitamente, com o vestido de noiva, a mulher em "Eu me rendo" encontra uma trincheira de arame farpado, como se estivesse em uma prisão ou em qualquer lugar no qual a delimitação do espaço em que pode circular o corpo e seus desejos é feita com a ameaça de torturá-lo.

Neste momento entra a ambígua temática da "rendição", pois a mulher, ao se render, se lança contra o arame que estraçalha seu vestido e deixa seu corpo nu, livre, logo, do contrato social efetivado pelo matrimônio - sem esquecer de que a roupa pode servir também de indicador de classe, gênero, raça ou etnia. É como se, ao se esquecer do seu "eu", de sua posição social, doando-se por completo ao limite que violentamente o assegura, ela acabasse por suprimir este "eu" e transgredindo o limite. O que resta daí é uma vida nua, num estado de crueza, aberta ao porvir.

Assim, a rendição, o deixar-se levar, assume um caráter de êxtase, de uma saída si, pois o limite, este Outro censor, o arame farpado patriarcal, é levado ao mais íntimo do corpo feminino de modo que o consome, retirando sua "qualificação" conferida pela roupa; ao passo que, na outra mão, esta desqualificação, esta nudez, diz de um novo "eu" que brota a partir da morte desta esposa-escrava, restando nada além da própria liberdade, da vida nua e natural, de uma imensa abertura nos interditos a partir da qual a rendição se torna, também, uma redenção.




Fotos: Luiza Palhares
Texto: João Guilherme Dayrell


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